Soberania, a obra e dormir bem

Tenho mantido minha confiança no Senhor e no Seu poder e não em mim. Então, eu posso ser feliz, ter descanso, paz, porque eu não tenho que fazer a obra que é do Senhor exclusivamente. Minhas responsabilidades são muito limitadas. Há muitas pessoas envolvidas na obra, as quais creem que o sucesso do Evangelho depende dos seus poderes de persuasão.

Marcos 4
26 E dizia: O reino de Deus é assim como se um homem lançasse semente à terra.
27 E dormisse, e se levantasse de noite ou de dia, e a semente brotasse e crescesse, não sabendo ele como.
28 Porque a terra por si mesma frutifica, primeiro a erva, depois a espiga, por último o grão cheio na espiga.
29 E, quando já o fruto se mostra, mete-se-lhe logo a foice, porque está chegada a ceifa.

Eu me sinto muito honrado e abençoado por esta oportunidade de comunhão e de podermos compartilhar assuntos tão importantes. Meditei arduamente diante do Senhor sobre o que deveria lhes falar nessa oportunidade.

O Evangelho de Marcos tem dominado minha mente nesses dias, porque tenho me dedicado a pregar sobre o mesmo. Mas, antes de lermos o texto de Marcos, gostaria de lhes falar um pouco do que chamo de ‘teologia de dormir bem’.

Geralmente, eu consigo dormir muito bem. Não importa onde eu me encontre no mundo, eu durmo. E eu acredito que a minha boa qualidade de sono, em algum grau, tem relação com aquilo que creio ser o modo estabelecido por Deus para desempenhar o ministério.

Se eu acreditasse que a salvação das almas depende de mim, creio que não conseguiria dormir bem. Eu entendo os horrores do inferno, sei sobre a ira de Deus, sobre o julgamento eterno.

E há uma paixão em mim em alcançar pessoas para Cristo através do Evangelho e isso domina meu coração. E posso dizer que, em alguns momentos e sob algumas circunstâncias, foi mais difícil conseguir dormir por causa da urgência de algumas demandas.

Porém, tenho mantido minha confiança no Senhor e no Seu poder e não em mim. Então, eu posso ser feliz, ter descanso, paz, porque eu não tenho que fazer a obra que é do Senhor exclusivamente. Minhas responsabilidades são muito limitadas.

Há muitas pessoas envolvidas na obra, as quais creem que o sucesso do Evangelho depende dos seus poderes de persuasão. E a ingenuidade dos que pensam assim os conduz inevitavelmente a ter que ajustar a mensagem do Evangelho para adequa-lo aos homens.

Eu prometo a você que se eu sentir por um minuto apenas que alguém foi parar no inferno porque de alguma forma eu falhei em fazer tais ajustes na mensagem do Evangelho, a fim de alcançá-lo, para persuadi-lo a crer, eu teria enorme dificuldade em dormir. Este é um fardo muito pesado para se carregar.

Não creio que precisamos ter esse tipo de atitude e creio que todos nós que aqui estamos não é porque tivemos que ser motivados por apelos emocionais de alguém, para compensar sua falsa teologia.

Antes, somos motivados pela Palavra de Deus, pelas Escrituras. E, neste momento, eu gostaria de examinarmos o capítulo quarto de Marcos, porque ele é de fato uma espécie de ‘constituição’, de ‘magna carta’ da parte de nosso Senhor sobre a questão de pregar o Evangelho. Este texto tem uma forte relação com o capítulo 13 de Mateus e o capítulo 8 de Lucas.

No início do capítulo há uma breve introdução: “E outra vez começou a ensinar junto do mar, e ajuntou-se a ele grande multidão, de sorte que ele entrou e assentou-se num barco, sobre o mar; e toda a multidão estava em terra junto do mar. E ensinava-lhes muitas coisas por parábolas, e lhes dizia na sua doutrina…” (vv.1-2).

Este é um cenário comum para Jesus em seu ministério na Galiléia, onde se ajuntavam massivas multidões, de modo que se espremiam e ajuntavam tanto que, muitas vezes, Jesus e os apóstolos não tinham nem como fazer uma refeição. As multidões eram numerosas, com dezenas de milhares de pessoas, fazendo-se necessário que algumas vezes Jesus tivesse que estar num bote no mar, a fim de ter algum espaço entre ele e a multidão.

A multidão era atraída pelo Seu poder sobre os demônios, as doenças, sobre a morte. Nunca houve qualquer negação a respeito dos seus milagres. Nem mesmo por parte dos líderes religiosos de Israel. Esses milagres eram tantos, tão constantes, elevados.

Mas, apesar de as multidões serem tão grandes e estarem fascinadas pelos milagres que o Senhor fazia, havia poucos com fé verdadeira entre eles. De fato, havia tão poucos que realmente criam, que mais tarde, em Lucas 13 um dos discípulos perguntou se somente poucos seriam salvos…

Para os discípulos, as coisas não estavam caminhando segundo suas expectativas. E eles tinham alguma razão nas suas expectativas, presumindo que eles eram conhecedores do Velho Testamento e, portanto, conheciam o que está escrito no nono capítulo de Isaías, que fala sobre a promessa da vinda do Messias de que seu reino e a extensão do seu governo não teriam fim. Ele teria um poder dominante no mundo.

E eles conheciam Isaías 45, esse grande capítulo que celebra a glória singular de Deus e diz que haveria o tempo em que Deus traria salvação não apenas para Israel, mas ao mundo. Também eles estavam familiarizados com o capítulo 60 de Isaías, que fala no mesmo sentido.

A vinda do Messias sempre estava conectada com a salvação para a nação de Israel e impacto internacional. Mas, a verdade era que em dois anos o Senhor estaria numa cruz… E, apesar do fascínio das multidões a respeito Dele, poucos realmente criam que Ele era o Messias.

O que estava errado? Onde estava o profetizado arrependimento da nação? Onde estava a redenção nacional? Onde estava o cumprimento da profecia sobre as nações gentias vindo a Israel e ao Deus de Israel? Qual era o problema?

Bem, alguém usando a razão carnal diria: ‘bem, temos que mudar nossa estratégia, porque isso de fato não está funcionando…’. Aliás, a razão carnal sempre responde dessa forma diante dos poucos frutos, dos números baixos como resultado da pregação do Evangelho.

É assim hoje. Muitos de nós poderiam sugerir a Jesus uma mudança de estratégia, ou que Ele seguisse as tendências, ou algum tipo de técnica psicológica, enfim, tentar fazer de outro jeito, buscando motivar as pessoas emocionalmente, materialmente, intelectualmente.

Este é o tipo de pensamento que está por detrás de todo ajuste aplicado ao Evangelho. E de alguma forma nós queremos quebrar a resistência do pecador e queremos fazer isso criando uma mensagem que quebre suas resistências, que o deixe mais confortável. Assim, a mensagem precisa ser amistosa e ajudaria também se fosse um pouco engraçada…

Dessa forma, a Igreja tem tentado melhorar os resultados numéricos da pregação da mensagem do Evangelho mudando a mensagem. E penso que de alguma forma os discípulos estavam tentando entender como se cumpririam todas aquelas conhecidas profecias messiânicas…

O capítulo 4 de Marcos é de fato repleto de instruções acerca da pregação do Evangelho. É fundamental entendermos o que a Bíblia ensina sobre esse assunto. Então, é de fato crucial entendermos o que diz esse capítulo de Marcos.

Quero começar pelos versículos 26 a 29. E é dessa parte do capítulo que vem o título dessa mensagem (‘Relação entre: soberania de Deus, o Evangelho e dormir bem’). O Senhor nos deixou uma série de importantes parábolas, mas esta, contida nos versículos 26-29, só está registrada no Evangelho de Marcos.

Ele prosseguiu dizendo: O Reino de Deus é semelhante a um homem que lança a semente sobre a terra. Noite e dia, estando ele dormindo ou acordado, a semente germina e cresce, embora ele não saiba como. A terra por si própria produz o grão: primeiro o talo, depois a espiga e, então, o grão cheio na espiga. Logo que o grão fica maduro, o homem lhe passa a foice, porque chegou a colheita.

O Senhor está falando sobre o Reino de Deus, do Senhorio sobre os crentes. E ao que se assemelha Seu Reino? A sementes são lançadas na terra e o fazendeiro não sabe o que acontece com elas, apesar de ele ser um agricultor, alguém que entende do assunto.

E a maravilha do Evangelho é esta: você o semeia e vai dormir… e a semente germina e cresce. Nós não temos controle sobre isso. Nós não sabemos como acontece. Embora um agricultor saiba que sementes lançadas no chão produzirão vida, ele não pode explicar como ocorre a geração da vida.

E o único ato humano mencionado pelo Senhor na parábola é que o fazendeiro semeia. Mas depois vai dormir. E a plantação cresce pela ação de forças completamente alheias ao fazendeiro. E mesmo o melhor dos fazendeiros – usando a linguagem do apóstolo Paulo em que um semeia, o outro rega, outro aduba – não tem o poder de dar o crescimento à planta, pois essa é uma obra privativa de Deus.

Nas palavras do Evangelho de João, com as quais estamos bem familiarizados, “Os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus.” (Jo.1:13) Nascimento espiritual, vida espiritual, semente que gera vida, que cresce: tudo é milagre da parte de Deus.

No capítulo 3 de João temos o bem conhecido encontro entre Jesus e o líder judeu Nicodemos. E nessa fascinante conversa, penso que Nicodemos está compreendendo bem as metáforas que Jesus está usando, porque eram usadas pelos judeus o tempo todo, então, creio que ele entendia bem que o Senhor não estava falando sobre questões físicas, mas espirituais.

Ele veio se encontrar com Jesus à noite, e ele entendia que Jesus vinha de Deus, como um Rabi, porque ninguém poderia fazer o que Ele fazia pela capacidade humana apenas. Foi o que ele disse inicialmente. Mas aí Jesus, conhecendo o seu modo de pensar, vai além de suas palavras e diz a ele que se alguém não nascer de novo, não pode ver o Reino de Deus. Jesus sabia que o que Nicodemos realmente queria entender era como alguém poderia entrar no Reino de Deus. Essa era a questão que o levou ali.

Jesus lhe diz que seria necessário nascer de novo. Jesus está falando sobre novo nascimento, sobre regeneração. Está dizendo a Nicodemos que da mesma forma que ele não contribuiu para seu primeiro nascimento, ele não teria como fazê-lo quanto ao segundo nascimento. E Nicodemos responde indagando como poderia um homem nascer de novo sendo já velho: ‘entraria de novo no ventre de sua mãe?’. Eles estão usando linguagem metafórica. O que ele está dizendo é que seria impossível para ele realizar o seu novo nascimento.

Aí Jesus lhe responde usando a linguagem de Ezequiel, quando trata da Nova Aliança: deve nascer da água e do espírito. Jesus está dizendo a Nicodemos: isso está além do seu poder. É obra divina, milagre divino, assim como a semente que o fazendeiro lançou no solo e dela a vida nasce e cresce. Essa não é uma obra do poder do homem, nem de sua energia humana. É o Espírito que age transformando, regenerando o homem.

Mesmo o Senhor Jesus entendia completamente essa verdade em Seu ministério terreno. E se conformava com isso. Uma das ilustrações que posso mencionar nesse sentido está em Lucas 23:39, na passagem bem conhecida acerca do ladrão na cruz: “E um dos malfeitores que estavam pendurados blasfemava dele, dizendo: Se tu és o Cristo, salva-te a ti mesmo, e a nós.”

Isso foi puro sacarsmo, zombaria. Mas, se formos analisar o que este ladrão estava dizendo, do ponto de vista meramente humano, parecia ter algum sentido, porque Jesus, que se proclamava ser o Filho de Deus, o Messias enviado, estava ali preso numa cruz, tendo experimentado todo tipo de sofrimento nas mãos dos líderes judeus e romanos. A crucificação era a pena para a escória dos criminosos. Não havia nada naquela cena que fizesse alguém enxergá-Lo como o Messias, o Ungido. Então, o sarcarsmo era humanamente razoável.

É como se aquele ladrão, também preso numa cruz, dissesse: ‘você está de brincadeira, supondo ser o Messias?’ Presumindo que esse ladrão fosse um judeu, ele conhecia o que era ensinado em todas as sinagogas sobre o Messias, sobre a influência que exerceria sobre Israel e sobre as demais nações. E Jesus estava lá, num momento de extrema fraqueza, do ponto de vista humano. Então, a atitude deste ladrão faz sentido, numa visão humana.

“Respondendo, porém, o outro, repreendia-o, dizendo: Tu nem ainda temes a Deus, estando na mesma condenação?” Essa é uma perspectiva totalmente diferente da outra. E este também era um ladrão condenado, sendo executado.

Mas, aí ele começa a agir como um teólogo e diz: “E nós, na verdade, com justiça, porque recebemos o que os nossos feitos mereciam; mas este nenhum mal fez.” Ele está afirmando a ausência de pecado em Cristo. Impressionante! Agora, pense na cena: Jesus está semi nu, pendurado numa cruz, sofrendo, sendo agredido, humilhado, zombado…. Nada impressionante ou impactante em sua pessoa, humanamente falando.

Mas, aquele ladrão pôde declarar que Jesus era perfeito, sem pecado. E, além de compreender a santidade de Cristo, Ele enxergou a soberania de Cristo, ao dizer: “Senhor, lembra-te de mim, quando entrares no teu reino.” (v.42) Ele enxergou o Reino de Jesus, Ele O viu como Rei!

“E disse-lhe Jesus: Em verdade te digo que hoje estarás comigo no Paraíso.” (v. 43). O que aconteceu com aquele ladrão ali naquela cruz, que o fez enxergar tais verdades? A única explicação para isso está no poder de Deus agindo em sua alma.

E você ainda crê que a revelação e regeneração na vida de alguém vem como resultado da sua inteligência e capacidade? Naquela cruz Jesus estava fraco, definhando, humanamente derrotado. Mas, ao seu lado, em outra cruz, o Espírito Santo trouxe vida a um coração, trouxe luz para olhos cegos, e uma clara fé que explodiu em total entendimento. A salvação veio àquele homem naquela mesma hora e naquele mesmo dia entrou no Paraíso com Cristo.

Não há explicação humana para isso! Para mim é a mais impressionante experiência de conversão no Novo Testamento. Lembre-se, a parábola diz que o fazendeiro semeou a semente e foi dormir. Porque ele não estava encarregado dos resultados.

No texto de Marcos 4:26-29, há um termo que eu gostaria de destacar. Está no versículo 28: “A terra por si própria produz o grão.” No original grego, a expressão “por si própria” tem o sentido de ‘automaticamente’. Essa expressão é repetida apenas uma vez no Novo Testamento, em Atos 12:10, quando Pedro é miraculosamente liberto da prisão e ao chegar à porta esta se lhe abriu “por si mesma”, no grego, “automaticamente”. Deus abriu a porta e a colheita cresce ‘automaticamente’. É automação divina.

O solo produz a planta por si só, e ela cresce e tudo o que o fazendeiro tem que fazer é esperar até o tempo da colheita. Nós podemos ser os meios, mas não somos o poder. Vocês entendem? Podemos ser os agentes secundários, mas não somos os agentes causadores. Nós plantamos a semente e vamos dormir e é papel de Deus dar o crescimento. E Ele o faz através de meios impressionantes.

Alguns interpretam essa parábola colocando Jesus no papel do fazendeiro e a colheita representando Sua segunda vinda. Mas, essa interpretação não se sustenta, porque o fazendeiro semeia e vai dormir. E Jesus não está dormindo. O Guarda de Israel não dorme.

Então, o sucesso do Evangelho não depende do nosso poder, da nossa manipulação ou habilidades. Vida espiritual e regeneração são ações divinas. Mas, devem existir alguns elementos essenciais para que Deus realize seu trabalho. E para entendermos isso, precisamos entender outras parábolas contidas nesse capítulo 4 de Marcos.

PRIMEIRO ELEMENTO: HUMILDADE

Não temos o poder de fazer a obra. Não podemos ter a ridícula ilusão de que temos esse poder.

No início do capítulo, temos a ‘parábola do semeador’, com a qual estamos bem familiarizados. Aqueles discípulos entendiam bem a diferença dos tipos de solos usada como ilustração por Jesus, porque a agricultura fazia parte do seu dia a dia. Eles conheciam o que era um solo bom para ser semeado, bem como o que era um solo infértil, pisado, cheio de pedras ou espinhos.

A figura que eles não conheciam na prática era a do solo em que a semente germina, cresce a planta e produz tanto fruto, que produziu trinta, outro sessenta, e outro cem por um. Eles não conheciam isso, porque sabiam que na prática da agricultura, na melhor das hipóteses, seria produzido seis por um. Jesus estava lhes falando através de uma superlativa linguagem figurativa a respeito de algo que eles nunca experimentaram.

O Senhor estava lhes falando através dessa parábola que a colheita haveria de ser massiva. E você conhece bem a estória. Havia três tipos de solos infrutíferos. O Senhor quis explicar essa parábola apenas aos seus discípulos (começando no verso 14): “O semeador semeia a Palavra”. É fundamental enxergarmos que não há qualquer adjetivo para descrever ou caracterizar o semeador.

Não há qualificações especiais para o semeador. Ele é apenas aquele que lança a semente. Simplesmente isso. No ato de semear a Palavra não importa qual seja o design da bolsa em que o semeador armazena as sementes que vai lançar, não importa seu estilo. Qualquer um que lança a semente é um semeador. A parábola não diz nada sobre o semeador. Ele não é a questão aqui.

A semente é a Palavra de Deus. Lembre o que Romanos 10 diz, que a fé vem pelo ouvir a Palavra concernente a Cristo. Então, a salvação é algo que é feito por Deus, mas ela não pode ocorrer sem que a pessoa ouça a Palavra sobre Cristo. A mensagem deve ser completa.

Você se lembra de que algumas vezes o Senhor disse aos discípulos: “não conte isso a ninguém”? Ele vai a casa de Jairo, traz sua filha de volta a vida e o que Ele ordena aos discípulos e aos familiares que testemunharam o milagre? “Não contem a ninguém”. Por que Ele disse isso?

Também no episódio da transfiguração, Ele disse aos três discípulos que estavam com Ele: “não contem a ninguém”. Alguns podem dizer que Ele agindo assim queria diminuir seu impacto messiânico para as multidões, para que o plano de que Ele chegasse à cruz fosse cumprido e as multidões não impedissem isso. Ou que Ele queria diminuir o impacto desses sinais sobre seus inimigos, a fim de que morresse no tempo determinado. Não. Não era por nada disso.

Ele mesmo nos dá a resposta a essa questão. Ele diz o seguinte: “Quem diz a multidão que eu sou? E, respondendo eles, disseram: João o Batista; outros, Elias, e outros que um dos antigos profetas ressuscitou. E disse-lhes: E vós, quem dizeis que eu sou? E, respondendo Pedro, disse: O Cristo de Deus.” (Lucas 9:18-20). E você se lembra que Mateus registra que Jesus ainda acrescentou que não era carne ou sangue que havia revelado isso a Pedro, mas o Pai? Ou seja, por divina revelação Pedro sabia quem Jesus era?

Mas, então, vem o versículo 21: “E, admoestando-os, mandou que a ninguém referissem isso”. Por que? A resposta está no versículo seguinte: É necessário que o Filho do homem padeça muitas coisas, e seja rejeitado dos anciãos e dos escribas, e seja morto, e ressuscite ao terceiro dia.” (v. 22). Ou seja, depois disso tudo acontecer comigo, conte a todo mundo!

A mensagem do Evangelho não diz respeito a curas, a multiplicação de comida e nem mesmo a mensagem consiste em ser Jesus o Messias. Mas, a mensagem diz respeito a Sua morte na cruz e a Sua ressurreição. Então, depois que isso aconteceu, a ordem mudou: vão e contem a todo mundo! (Mt. 28:19-20). Essa é a ‘Grande Comissão’!

A semente é a mensagem de que Cristo morreu e ressuscitou. “Se com tua boca confessares que Cristo é o Senhor e se de todo o coração creres que Ele ressuscitou dos mortos, serás salvo.” (Rm 10:9). Esta é a semente do Evangelho, que diz respeito a Cristo. É uma mensagem ofensiva. É escândalo para os judeus e tolice para os gentios. (1 Co.1:23). Ou seja, para estes a mensagem não quer dizer nada, não muda nada.

Porém, o versículo 24 de 1 Coríntios 1, diz: “Mas para os que são chamados, tanto judeus como gregos, lhes pregamos a Cristo, poder de Deus, e sabedoria de Deus.” A todos os que ouviram o chamado divino, a todos os que estão debaixo do operar “automático” divino, a todos a quem o vento do Espírito sopra, a estes pregamos a Cristo. E a semente, que sempre será escândalo e tolice para o homem natural, torna-se poder de Deus e sabedoria de Deus para os que são chamados.

E o versículo 30 conclui: “É, porém, por iniciativa Dele que vocês estão em Cristo Jesus…” (nvi). É pelo agir de Deus que vocês estão em Cristo Jesus. “Para que, como está escrito: Aquele que se gloria glorie-se no Senhor.” (v. 31).

E Paulo continua no cap. 2:

E eu, irmãos, quando fui ter convosco, anunciando-vos o testemunho de Deus, não fui com sublimidade de palavras ou de sabedoria. Porque nada me propus saber entre vós, senão a Jesus Cristo, e este crucificado.

E eu estive convosco em fraqueza, e em temor, e em grande tremor. E a minha palavra, e a minha pregação, não consistiram em palavras persuasivas de sabedoria humana, mas em demonstração de Espírito e de poder; para que a vossa fé não se apoiasse em sabedoria dos homens, mas no poder de Deus.” (v. 1-5).

Paulo entendeu completamente: pregue a mensagem do Cristo crucificado e ressurreto, ainda que ela seja rejeitada, ainda que pareça uma estupidez e uma vergonha para alguns, mas pregue porque há aqueles que foram chamados, aqueles nos quais o Espírito sopra, aqueles nos quais a vida divina se desenvolve ‘automaticamente’. Este é o poder de Deus para a salvação.

Então, voltando à parábola, ela trata de semente e solos. O semeador, como vimos, pode ser qualquer um que semeia. Mas, a semente tem que ser a correta. Não pode ser modificada. E penso que ela tem sofrido muita modificação. Isso tem acontecido o tempo todo. Em todos os lugares temos visto igrejas mutantes geradas a partir de sementes modificadas.

Mas, a questão principal é o solo. A maior parte da parábola diz respeito aos solos. O primeiro é o solo seco, duro. Veja, o semeador lançar a semente, mas não tem como mudar o solo. Consegue ver isso? Está além do seu encargo fazer isso. Ele apenas lança a semente e vai dormir.

É bem comum o pensamento de que podemos mudar ou manipular o coração (o solo). Em meu ministério de pregação da Palavra, nunca propositadamente apelei à vontade humana. Nunca tentei direcionar ou manipular a vontade das pessoas, ou apelar para as suas emoções. Não tenho interesse em estimular os sentimentos das pessoas. Todo apelo deve ser à mente, para entender a verdade.

Se você apelar às emoções das pessoas, você apenas terá uma resposta emocional. Não tente influenciar a vontade das pessoas, porque você obterá uma resposta da vontade própria. Sempre se dirija às mentes. Jonathan Edwards escreveu, em 1746, “É extremamente importante conhecer que a natureza humana caída é um solo fértil para a religiosidade carnal.”

Fortes experiências emocionais, abordagens sentimentalistas, animosidades, uso de recursos para emocionar (músicas, etc), passam longe da real obra do Espírito, que é transformar a alma, transformar o caráter.

Creio que o ponto central disso tudo é sabermos onde ocorre a verdadeira obra do Espírito na vida do homem, a qual não serve para produzir uma breve satisfação, mas produz humildade, paciência, mansidão, generosidade, quebrantamento, pessoas sendo quebrantadas pelo peso de suas iniquidades. Em todas as falsas conversões essa obra do Espírito não existe.

Então, o alvo da pregação da Palavra deve ser o arrependimento do pecador. Isso faz com que a receptividade à Palavra seja difícil, pois a mensagem inclui autonegação, aborrecer a si próprio, aborrecer a pai, mãe, tomar a cruz. É por isso que Jesus, quando alguém lhe perguntou se eram poucos que seriam salvos (Lc 13:23-24), Ele respondeu que é difícil.

Há muitos tentando entrar no Reino, mas eles não podem, porque eles não podem vencer a vontade própria, não conseguem alcançar o que está em Lucas 18:13, ‘Senhor, tem misericórdia de mim, porque sou um pecador!’.

E isso não é porque Jesus não seja desejável. Ele é muito desejável. Mas, não basta uma pessoa nutrir bons sentimentos em relação a Jesus. Não é suficiente que o homem seja motivado por algum benefício que Jesus possa lhe conceder ou que seja motivado por algum tipo de excitação emocional.

Spurgeon disse: “as pessoas que vêm a Cristo por motivações emocionais, elas vêm e vão do mesmo jeito que vieram. Eles entram na sala da inquirição em cinco minutos e esse é o único ato de piedade que fizeram até o resto de suas vidas.”

Essas são pessoas que são como as sementes lançadas sobre as pedras, geram plantas sem raízes, pessoas que são ligadas às coisas do mundo, às paixões enganosas, às distrações desta era. O fato é que seus corações têm que lidar com essas questões.

Existem os corações duros como o solo pisado, compactado. Há também os superficiais, que recebem a verdade por um tempo. E, vale dizer, alegria diante da verdade não é indicação de uma fé verdadeira. Verdadeiro arrependimento não é necessariamente uma experiência alegre. Antes, pode ser agonizante. É marcado por profunda humilhação do homem quebrantado em amor diante de Deus.

Então, nós entendemos que na pregação da Palavra estaremos lidando com corações duros, superficiais, distraídos, de dupla mente, ainda apegados às coisas dessa vida e desse mundo. Mas, a questão crucial é: nós não temos o poder de mudar tais corações. Não podemos dar vida a mortos, luz às trevas, vista a cegos.

Assim, nós abordamos nosso ministério humildemente. Porque nós só podemos lançar sementes. Não temos o poder. Somos simplesmente os meios humanos. Somos apenas semeadores.

Há um maravilhosa declaração em Deuteronômio 30:6, onde se diz: “E o Senhor teu Deus circuncidará o teu coração, e o coração de tua descendência, para amares ao Senhor teu Deus com todo o coração, e com toda a tua alma, para que vivas.” É o Senhor quem dá vida espiritual. O mesmo se repete em Ezequiel 36:26-27, Jeremias 31:31-34. Essa é a obra do Senhor: remover o coração de pedra e dar um novo coração, de carne. É obra do Senhor colocar o Seu Espírito no coração do homem.

Então, nós semeamos e dormimos. Humildade é o primeiro elemento.

SEGUNDO ELEMENTO: OBEDIÊNCIA

O segundo elemento é encontrado em Marcos 4:21-23, que diz: “Vem porventura a candeia para se meter debaixo do alqueire, ou debaixo da cama? não vem antes para se colocar no velador? Porque nada há encoberto que não haja de ser manifesto; e nada se faz para ficar oculto, mas para ser descoberto. Se alguém tem ouvidos para ouvir, ouça.”

Nós temos que ser humildes, porque sabemos que não possuímos o poder para salvar, gerar arrependimento. Mas, temos que ser obedientes, porque nós sabemos que possuímos a luz. Este é o ponto central desta parábola.

Alguém poderia pensar que pelo fato de todo poder restaurador estar com o Senhor, nós não temos qualquer papel nisso. Mas, o que essa parábola nos diz é: ‘não encubra a luz, não a esconda. Você tem a luz. Não ponha a luz debaixo de uma cesta ou da cama. Coloque a luz onde todos possam vê-la.’

Então, a humildade vem de sabermos que não temos o poder para mudar os corações. Mas, a obediência vem por sabermos que somos o meio pelo qual a luz vem. “Ide pelo mundo e pregai o Evangelho” (Mt. 28:19). Faça discípulos. Seja testemunha “tanto em Jerusalém, como em Samaria, Judéia e até os confins da terra” (At. 1:8), movidos pela unção do Espírito. Há vida na luz do Evangelho.

“Porque nada há encoberto que não haja de ser manifesto; e nada se faz para ficar oculto, mas para ser descoberto.” (v.22). O que Jesus está dizendo aqui é que o propósito de manter algo escondido por certo tempo é para que no tempo preciso deva ser revelado. Apesar de o Senhor lhes dizer algumas vezes ‘não contem isso a ninguém’, haveria o tempo em que tais segredos deveriam ser revelados e espalhados.

TERCEIRO ELEMENTO: DILIGÊNCIA

Alguns podem pensar que o fato de crermos que a obra de salvação e regeneração são de responsabilidade exclusiva de Deus, que isto retiraria a motivação de pregar a Palavra. Mas, observem os versículos 24 e 25:

E disse-lhes: Atendei ao que ides ouvir. Com a medida com que medirdes vos medirão a vós, e ser-vos-á ainda acrescentada a vós que ouvis. Porque ao que tem, ser-lhe-á dado; e, ao que não tem, até o que tem lhe será tirado.

É preciso que você entenda que você não é a causa da salvação, da regeneração de alguém. Mas, você é o meio, o veículo. Então, embora você saiba que o poder pertence a Deus, o que te fará andar em humildade, você também sabe que tem que obedecer a ordem de ser um meio por onde a luz da Palavra se espalha.

Eis aqui a motivação para pregar a Palavra com diligência: “Com a medida com que medirdes vos medirão a vós e ser-vos-á ainda acrescentada a vós que ouvis”. A utilidade na semeadura da Palavra é medida proporcionalmente a quantas sementes cada um semeia e isso influenciará a recompensa eterna. Então, quem semeia pouco, colherá pouco. Quem muito semeia, ceifará em abundância.

Assim, semeie e o faça diligentemente, porque você sabe que o seu serviço será avaliado proporcionalmente a quantas sementes você semeou. Isso conduz a bênção divina, a recompensa eterna. É semeando a Palavra que você “obterá amigos para a eternidade” (Lc 16:9).

Por outro lado,“ao que tem, ser-lhe-á dado; e, ao que não tem, até o que tem lhe será tirado”. Há pessoas não regeneradas, não verdadeiramente nascidas de novo que estão realizando a obra, fazendo alguma espécie de semeadura, crendo que receberão a recompensa. Mas, no final, eles dirão: ‘Mestre, fizemos isso e aquilo em Teu nome…’, porém, a resposta para estes será: “não vos conheço nem sei de onde vós sois; apartai-vos de mim, vós todos os que praticais a iniqüidade.” (Lc 13:27).

Mas, para os verdadeiros cristãos, os salvos regenerados, que semeiam a verdadeira semente, a promessa é: ‘vocês vão receber mais!’. Mais de que? De tudo: mais de toda graça, bondade da parte de Deus. Mateus 13:12, diz: “Porque àquele que tem, se dará, e terá em abundância; mas àquele que não tem, até aquilo que tem lhe será tirado.”

QUARTO ELEMENTO: CONFIANÇA

Então, nós semeamos humildemente e vamos dormir, porque não somos encarregados dos resultados; semeamos em obediência, porque somos apenas os meios de espalhar a luz; também o fazemos diligentemente, porque nosso serviço é avaliado proporcionalmente à nossa fidelidade. E, finalmente, semeamos em confiança.

E dizia: A que assemelharemos o reino de Deus? ou com que parábola o representaremos? É como um grão de mostarda, que, quando se semeia na terra, é a menor de todas as sementes que há na terra; Mas, tendo sido semeado, cresce; e faz-se a maior de todas as hortaliças, e cria grandes ramos, de tal maneira que as aves do céu podem aninhar-se debaixo da sua sombra. ((Mc 4:30-32).

Semeamos com confiança, porque Deus já determinou um resultado exponencial, imenso. Qual será o resultado final? O que devemos esperar dessa pequena semente do Reino? Lembre que o que começou com uma pequena semente, um pequeno grupo de pessoas, logo resultou em “esses que têm alvoraçado o mundo chegaram também até nós.” (At. 17:6b).

A propósito, o versículo 32 do capítulo 4 de Marcos é uma referência a Ezequiel 17. O significado de ‘aves fazendo seus ninhos à sombra da grande árvore’ é encontrado em Ezequiel 17: as aves representam as nações do mundo.

Há uma ilustração semelhante em Daniel, capítulo 4: Nabucodonosor tem uma visão em que vê uma árvore representando o seu reino e também há aves que vêm se aninhar, representando as nações. Ezequiel profetiza sobre o Reino do Messias e todas as nações da terra se achegando ao grande Reino.

Essa é uma profecia que vai se cumprir, que fala da explosão final do crescimento do Reino. O Evangelho sendo espalhado pelo mundo, a Igreja sendo espalhada pelo mundo, culminando no final glorioso do Reino de Jesus Cristo sobre toda a Terra.

Podemos semear a semente com humildade, obediência, diligência e confiar os resultados nas mãos do Senhor. Jesus alimentou cerca de 25.000 pessoas, de acordo com Marcos 6, multiplicando 5 pães e 2 peixes.

E, ao final, quando todos já tinham sido alimentados, Jesus ordenou que os discípulos fossem para o mar num bote, e Ele foi orar e depois foi ao encontro dos discípulos, andando sobre o mar. E quanfo Ele entrou no barco, o vento se aquietou (v. 51).

E isso deixou os discípulos atônitos, maravilhados. E essa era a noite do dia em que Ele tinha alimentado miraculosamente a multidão. Mas, Marcos registra que eles “não tinham compreendido o milagre dos pães; antes o seu coração estava endurecido.” (Mc 6:52).

Notem que eles viram Jesus fazer pães de um trigo nunca plantado, que nunca cresceu, e O viram alimentar a multidão com peixes que nunca estiveram na água, nunca nadaram, porque Jesus estava criando a comida. E após todos comerem, juntaram doze cesto de sobras! E aqueles homens não entenderam nada, porque os seus corações estavam endurecidos!

Porém, Mateus nos conta que quando Jesus entra no barco e acalma o vento, a reação daqueles mesmos homens foi: “Então os que estavam no barco o adoraram, dizendo: ‘Verdadeiramente tu és o Filho de Deus’.” (Mt. 14:33). O que aconteceu? Como eles passaram da dureza incrédula de coração diante de um tão grande milagre para essa atitude de adoração reverente?

Bem, creio que quando Jesus os deixou seguir no barco e subiu o monte para orar a sós (Mt. 14:23), Ele foi interceder por aqueles homens, pois conhecia sua dureza de coração. E naquela mesma noite, quando o Senhor sobe no barco, aqueles homens puderam dizer: ‘Tu és o Filho de Deus!’. Creio que o Pai, naquela mesma noite, ouviu a oração do Seu Filho por eles e abriu-lhes os corações. E este foi um grande momento de transformação!

Em meio às mais improváveis circunstâncias e caminhos, ‘automaticamente’, a vida vem e quebra a dureza de coração. O fardo não é meu, exceto o de semear A SEMENTE.


Este texto é uma síntese do sermão “God’s Sovereignty, the Gospel, and Sleeping Well”, de John MacArthur em 14/04/2010.

Você pode ouvi-lo integralmente (em inglês) no link abaixo:

http://www.gty.org/video/Conferences/CONF-T4G10-05

Tradução e síntese feitos pelo site Rei Eterno


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