Em Palavra, ou em Poder

Porque o nosso evangelho não chegou até vós Tão-somente em palavras, mas sobretudo em poder, No Espírito Santo
I Tess. 1:5

Se alguém está em Cristo, é nova criatura.
II Cor. 5:17

Tens nome do que vives, e ainda estás morto.
Apoc. 3:1

Para um mero estudioso da Bíblia, estes versículos podem ser interessantes, mas para um homem sério, dotado de valores eternos, podem provar-se mais do que algo perturbadores. Pois, eles ensinam que a mensagem do evangelho pode ser recebida de uma destas formas: em palavra somente, sem poder, ou em palavra com poder. Também ensinam que quando a mensagem do Evangelho é recebida em poder, efetua uma mudança tão radical que se pode chamar de nova criação. Mas a mensagem pode ser recebida sem poder, e, por certo, alguns a receberam desse modo, pois têm nome de que vivem, e estão mortos.

Na maioria, os homens na verdade, brinca de cristianismo, sendo este o jogo mais popular. Como um atleta usa uma bola, assim muitos usam palavras: palavras faladas e palavras cantadas, palavras escritas e palavra proferidas em oração. Nós as atiramos rapidamente pelo campo; aprendemos a manejá-las com destreza e graça; edificamos reputações sobre nossa habilidade verbal e ganhamos nossa recompensa com o aplauso dos que apreciaram o jogo. Mas a vacuidade disso transparece do fato de que, após o “jogo cristão”, ninguém é nada diferente do que era antes. As bases da vida continuam inalteradas, os mesmos princípios antigos dominam, o mesmo velho Adão governa.

Eu não disse que um cristianismo sem poder não faz nenhuma mudança na vida de alguém; disse apenas não faz nenhuma diferença fundamental. A água pode mudar de líquido para vapor, de vapor para neve e de novo para líquido, e continua fundamentalmente sendo a mesma coisa. Assim, o cristianismo sem poder faz no homem diversas mudanças superficiais, porém, deixando-o exatamente igual ao que era antes. É justamente aí que está a armadilha. As mudanças são apenas de forma, não de natureza. Por trás do homem não religioso e do homem que recebeu o evangelho sem poder estão os mesmos motivos; Um ego não abençoado jaz no fundo de ambas as vidas, com a diferença que o ultimo aprendeu a disfarçar melhor o defeito. Os seus pecados são mais refinados e menos ofensivos do que antes, mas não é melhor aos Olhos de Deus. Na verdade pode ser pior, pois Deus abomina o artificialismo e o fingimento. Ele se torna vítima de um cristianismo sem poder.

O homem que recebeu a Palavra sem poder apurou a sua sebe, mas esta continua sendo uma sebe de espinhos e jamais poderá produzir os frutos da nova vida. Os homens não podem colher uvas dos espinheiros nem figo dos abrolhos. Entretanto, tal homem pode ser um líder na igreja, e as suas idéias podem chegar a influenciar sua geração.

A verdade recebida em poder muda as bases da vida do homem para Cristo, e um novo conjunto de motivos entra em ação dentro da alma. Um novo e diferente Espírito penetra personalidade e torna o cristão um homem novo em cada parte de seu ser. Os seus interesses mudam das coisas externas para as internas, das coisas da terra para as do céu. Ele perde a fé na solidez dos valores externos, vê claramente o desengano das aparências exteriores, e o seu amor pelo mundo invisível e eterno e sua confiança nele torna-se mais fortes à medida que a sua experiência se amplia.

Com as idéias aqui expressas a maioria dos cristãos concordará, mas o abismo entre a teoria e a prática é tão grande que chega a ser aterrador. Pois o Evangelho é com demasiada freqüência pregado e aceito sem poder, e nunca se efetua alteração radical que a verdade exige. Pode haver, é certo, uma mudança de alguma espécie; pode-se fazer um negócio intelectual e emocional com a verdade, mas o que quer que aconteça não basta, não é o bastante profundo, não é suficientemente radical. A “criatura” é mudada, mas ele não é nova. É justamente aí que está a tragédia. O Evangelho tem que vir com uma vida nova, com um nascimento para cima, para um novo nível de ser e, enquanto ele não efetuar esses renascimento, não realizou a obra salvadora dentro da alma.

Sempre que a Palavra vem sem poder, falta o seu conteúdo essencial. Pois há na verdade divina uma nota imperiosa, há em torno do Evangelho uma urgência, uma finalidade que não pode ser ouvida ou sentida, a não ser com a capacitação do Espírito. Devemos manter em mente que o Evangelho não é boa nova semente, mas também um julgamento de todo aquele que o ouve. A mensagem da Cruz é de fato boa nova ao homem quebrantado, mas para os que não obedecem ao Evangelho traz consigo uma grave advertência. O Evangelho é paz irrestrita aos que se convertem a Jesus, mas por sua própria natureza, é um juiz do destino futuro dos homens.

O evangelho age assim: O homem que crê é subitamente dominado por uma vigorosa sensação de que só Deus importa; logo isto passa a agir em sua vida mental e condiciona todos os seus juízos e todos os seus valores. Agora ele se vê livre da escravidão das opiniões humanas. Um forte desejo de agradar somente a Deus toma posse dele. Logo aprende a querer acima de tudo mais a certeza de que está sendo agradável ao Pai celestial.

É esta mudança completa em sua fonte de prazer que torna invencíveis os homens de fé. Assim, os santos e mártires puderam ficar sós, abandonados por todos os amigos terrenais, e morrer por Cristo debaixo do aborrecimento universal da humanidade. Quando, para intimidá-lo, os juízes de Atanásio o advertiram de que o mundo inteiro estava contra ele, Atanásio ousou replicar: “Então é Atanásio contra o mundo.” Esse brado cruzou os séculos e hoje pode fazer-nos lembrar que o Evangelho tem poder para livrar os homens da tirania da aprovação social e os torna livres para fazer a vontade de Deus.

A W Tozer

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